Apertem os cintos: a reputação sumiu

Por: Sergio Bialski

São necessários 20 anos para construir uma reputação e 5 minutos para arruiná-la. Se você pensar nisso, fará as coisas de modo diferente”.

Essa frase, proferida pelo bilionário norte-americano Warren Buffett, um dos maiores investidores da história, deveria estar colada no espelho do banheiro de cada um de nós para que, ao fazermos o asseio matinal, pudéssemos sempre lembrar de nossa responsabilidade com o maior patrimônio que temos: a reputação.

Especialistas colocam os ativos intangíveis (dentre os quais a reputação) como sendo responsáveis por mais de 80% do valor de uma marca. Não é à toa que corporações com reputação ilibada são tão atraentes, despertando o interesse de jovens universitários que querem construir suas carreiras a megainvestidores que querem aportar vultosos recursos, afinal, ela se baseia numa percepção coletiva sobre a capacidade de gerar valor para os stakeholders, com base na história construída ao longo de décadas.

Construir uma história de vida não é tarefa para amadores, mas destruí-la certamente é. Basta conferir as manchetes veiculadas pela imprensa e notar como as de natureza corporativa frequentam as páginas policiais. Basta também conferir qual o conglomerado que formalizou na Justiça de São Paulo, no último dia 17 de junho, o maior pedido de recuperação judicial da história do país. Seu nome? Odebrecht S.A., é claro.

O total da causa é de R$ 83,627 bilhões, que corresponde ao valor do passivo sujeito à recuperação. Somados os R$ 83,627 bilhões a outros R$ 14,5 bilhões em dívidas não passíveis de recuperação, a dívida total chega a cerca de R$ 98 bilhões.

Esses números impressionam, mas há outros mais assustadores, que cobram um preço maior: a empresa, que chegou a ter mais de 180 mil empregados, cinco anos atrás, hoje tem 48 mil postos de trabalho. Ou seja: a ganância desenfreada e a insensatez da alta direção da Odebrecht roubaram os sonhos de muitos brasileiros decentes que lá trabalham e que aprenderam, desde tenra idade, lições de decência moral.

Os efeitos da operação Lava Jato, da qual a Odebrecht foi um dos principais alvos, impactaram em cheio as receitas e aumentaram as dívidas, afinal, quem é louco de fornecer crédito ou contratar os serviços de uma companhia que funciona como Organização Criminosa (OrCrim)? E não se trata de uma qualquer: estamos falando de uma OrCrim que atuou com requintes de crueldade, chegando a montar uma área, em seu organograma, para cuidar exclusivamente de propinas (pomposamente batizada de “Setor de Operações Estruturadas”), tanto no Brasil como no exterior, tudo isso, claro, com as bênçãos e comando dos próprios executivos mandatários. Um deles, Marcelo Odebrecht, que deixou a prisão em Curitiba depois de dois anos e meio detido, e o patriarca do grupo, Emílio Odebrecht, que se esforça para mostrar ao mercado que as práticas da empresa mudaram, como num passe de mágica. Difícil acreditar, já que Emílio, o fiador desta “nova cultura”, teve papel destacado nas delações premiadas e continua comandando e dando as cartas.

Não é preciso ser especialista para saber que reputação é uma moeda de troca cada vez mais relevante para qualquer marca – independente do mercado de atuação – e os estragos que danos a ela podem causar, afinal, acontecimentos ocorridos em diferentes espaços geográficos são facilmente transmitidos num curto espaço de tempo, razão pela qual o zelo pela transparência e por práticas éticas passa a ser uma necessidade comercial de sobrevivência.

Potenciais clientes acessam plataformas como o ‘Reclame Aqui’ e ‘Love Mondays’ para ler o que os públicos externo e interno, respectivamente, têm a dizer sobre determinadas marcas. A maneira como estas lidam com objeções é tão importante quanto as próprias objeções, afinal, saber ouvir e dar um rápido feedback devem fazer parte da cultura organizacional.

Foi-se o tempo em que construção de marcas era ditada somente por ações de comunicação/marketing baseadas em discursos grandiloquentes. Cada vez mais atenta, a sociedade exige que discurso e realidade sejam indissociáveis. Nesse sentido, a Odebrecht ganhou uma nova chance, ao solicitar sua recuperação judicial. Mas que ela e seus executivos não se enganem: estamos de olho, pois apesar das suas supostas intenções de retornar ao bom caminho, jamais esqueceremos do prejuízo incalculável e dos efeitos nefastos que ela causou ao País. “Gato escaldado tem medo de água fria”. E sociedade vigilante ainda temerá, por muitas décadas, Odebrecht e seus asseclas.